Fiquei sabendo que tem gente escrevendo muito nessa pandemia, gente que nunca escreveu está escrevendo. Diários, poesias, contos, escrevendo o que vem na cabeça. Eu sempre escrevi, desde aquele primeiro de janeiro de 1975, quando estava longe do meu país e achei que seria bom registrar aquele exílio. Escrevia à mão, depois passei pra máquina de escrever e agora escrevo aqui nesse computador. Hoje, por exemplo, quando saí cedo pra passear com o nosso cachorro, uma mulher caminhando ao meu lado disse que o Canela é uma graça. O Canela é um vira-lata, mas é realmente uma graça. Ela contou que só passeia com o dela à noite, quando chega em casa depois do trabalho. Ele passa o dia no quintal que dá também pra varanda. Contou que ele adora enfiar o focinho na grade e ficar observando o movimento da rua. Mas agora mudou uma mulher para a casa do lado que está implicando com ele, ela não gosta de cachorro. Disse que ele devia ficar preso. “Ora, a casa é minha, moro lá há dez anos e não vou deixar ele preso. Se ela está incomodada, que se mude”. Antes de nos despedirmos, na esquina de Roma com Catão, ela concluiu: ‘mas eu não sou boba nem nada. Instalei uma câmera porque vai que ela resolve envenenar o Suck, não é mesmo? Pronto, escrevi.
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