Pensando bem, tem sido saudável ao país, o silêncio do presidente da República. Um silêncio quase sepulcral, desde aquele 30 de outubro quando foi derrotado nas urnas e recebeu o aviso prévio para desocupar o imóvel onde mora há quase quatro anos.
Para um cara que só abria a boca para dizer besteiras, nada melhor que ela fechada. Nessas horas, o silêncio é de ouro.
No mundo politico e internacional, esse desaparecimento, esse confinamento do homem que ainda comanda o país, é um vexame. Normalmente, perdedores reconhecem a derrota, parabenizam os vencedores e se colocam à disposição para ajudar o país na transição, na passagem do poder, da faixa.
Mas aqui neste país tropical não aconteceu nada disso. Sua única aparição durou alguns poucos minutos, não mencionou o nome do vencedor, na verdade, não disse coisa com coisa.
Nesse quase um mês de vacância de poder, o Brasil vai caminhando no piloto automático, mil vezes mais competente que o próprio presidente. Além de não aparecer para agradecer a quase metade de todos os votos dos eleitores, ele não deu as caras para lamentar a morte de Gal Costa, de Rolando Boldrin, de Erasmo Carlos, de Fernando Campana, para ele, todos comunistas.
Mas para quem nunca deu as caras para lamentar a morte de quase 700 mil pessoas, vítimas da pandemia, esperar o quê?
O presidente da República vive uma agonia. Dizem que está ruim das pernas, mas ele foi incapaz de fazer um pronunciamento à nação dizendo que entraria em licença para tratamento de saúde. Se está doente, guardou pra si a doença. Como fez o regime militar nos anos 1960, quando o então ditador Arthur da Costa e Silva sofreu um enfarto.
O que resta a Jair Messias Bolsonaro daqui pra frente? Ler, estudar, ele não é chegado. Viajar, conhecer e viver outras culturas, tampouco. Talvez ele organize alguns motoristas para um percurso tipo selvagem da motocicleta.
Muito acreditam que ele estará na oposição. Será que ele sabe fazer oposição? Do emprego que ganhou no PL, talvez peça demissão logo logo, já que não é chegado ao batente.
Pode ser que não, mas tudo leva a crer que Bolsonaro será o terceiro personagem daquela série infantil Bananas de Pijama.
Ele não torceu pro Irã, que levou de seis a dois da Inglaterra, apesar de estar sempre do lado do mais fraco. Aqui no Brasil, torce pelo América Mineiro. Torcer pelo Irã, que tem reprimido violentamente as mulheres, desde que Mahsa Amini morreu nas mãos da polícia, não! Ele quer que o Irã perca os três primeiros jogos e volte pra casa, pra desgosto dos aiatolás.
Ficou triste ao ver a zebra entrar em campo no jogo entre Argentina e Arábia Saudita. Teve vontade de soltar fogos com o primeiro gol de Messi, mas foi perdendo a graça com a virada.
Ele torce por todos os times da América Latina: Argentina, Uruguai, Costa Rica, México, amou a vitória do Equador por dois a zero em cima do Qatar, país que oprime as mulheres e não respeita os direitos humanos, trabalhistas.
Não torce pelos Estados Unidos porque não gosta dos americanos, que ainda chama de yankees. Não importa se são os democratas ou os republicanos que estão no poder. Quando jovem, não tomava Coca-Cola, não mascava chicletes nem comia batatinhas Pringles, artigos imperialistas.
É um torcedor fanático da República dos Camarões, desde que leu, nos anos 1980, uma reportagem na revista Actuel, que dizia que os jogadores, com pouco dinheiro no bolso, iam de coletivo pros treinos, levando a própria chuteira dentro de uma sacola de pano.
Ele torce para a Alemanha só porque é apaixonado por Berlim, mesmo depois daquele sete a um. Nos anos 1970, ele torcia para a RDA, a República Democrática Alemã, a Alemanha Oriental, comunista.
Não faz a menor questão de torcer para times sem graça, tipo Suiça, Canadá e Austrália.
Sempre torce pra França, morou lá uma década exilado e guarda um carinho pelo país. Sabe que o Brasil já foi eliminado duas vezes pelos franceses, mas não sabe torcer contra. É o seu segundo país.
Holanda, ele ama, desde aquele escrete que todos chamavam de laranja mecânica.
Ama também o colorido dos uniformes de quase todos os africanos. E a alegria deles na hora de um gol, às vezes raro.
Portugal ele sempre torce a favor, desde aquele 25 de Abril, desde a Revolução dos cravos. Espanha também, desde a morte de Francisco Franco.
Sente saudade da seleção do Peru, ainda mais quando Didi era o técnico. Sempre lembra também da exótica Coréia do Norte que, diz a lenda, colocou o técnico no paredão depois da eliminação.
Gostaria de ver em campo a Samoa Americana, a pior seleção do mundo, aquela que no dia 11 de abril de 2001, perdeu de 31 a 0 pra Austrália.
Gostaria de ver na copa países que nunca foram: Líbano, Kuwait, Cuba, Barbados, Vietnã, países assim.
Quanto ao Brasil, ele fica em dúvida. Jurava nunca mais vestir a camisa amarela e sair por aí desde que os bolsonaristas se apoderam dela. Mas como Lula venceu as eleições, tem pensado duas vezes.
A dúvida dele é como torcer pelo Brasil e contra Neymar, pelo conjunto da obra.
Querido colega-amigo Alberto: muito bom este O SOL para aquecer nosso domingo. Seu editorial, excelente, noticias oportunas e precisas! Adorei rever o Tonzé e o Krenac de quem sou fan. Parabéns por toda a edição! Torçamos pelo Brasil na Copa e pela posse do Lula.
Abraço e vamo que vamo!